O que fazer | Onde ficar | Como ir

Imagine que você seja um turista gringo visitando o Rio de Janeiro. Seus planos são alugar um carro para conhecer as redondezas; de repente ir até a região dos lagos. Daí alguém te conta que, na contramão, a uns 300 Km de distância está uma cidadezinha – supostamente Paraty – que tem como principal (e única) atração um… museu. Mas é um museu histórico, interessantíssimo. A pergunta é: você encaixaria este não planejado tour no seu roteiro?

Tudo bem, vai. Eu sei que minha analogia é péssima, mas é que Fray Bentos, no Uruguai, gera mais ou menos a mesma dúvida.

A cidade já deixou o Prata de lado e está localizada à beira do Rio Uruguay, lá em cima, distante 320 Km de Montevidéu – de carro, a visita funciona melhor como uma extensão do passeio por Colonia del Sacramento (a 210 Km). E se alguém por aí te soprar essa dica, ainda que você ache o caminho contramão, eu te conto logo que uma atração por si só já compensa a viagem até Fray Bentos: o fascinante Museu El Anglo ou Museu da Revolução Industrial.

O QUE FAZER

Fray Bentos é um lugarzinho despretensioso. Chegamos no entardecer e nem precisamos prestar atenção para alcançar a beira do rio. Nada de trânsito, poucas pessoas na rua; o retrato de uma vida pacata.

A rambla deles é uma avenida pequena, mas com um calçadão bacana. O movimento rola durante todo o dia, e no fim de tarde enche de molecada local andando de skate ou bicicleta. Tudo é bem arborizado, entre palmeiras e chorões, e o clima é agradável.

A janta no restaurante El Entorno, que é bem ajeitadinho, estava boa: cerveja gelada e carne no ponto. Ainda rolou um “show” de mágica divertido o suficiente para umas risadas.

Clímax

O must do must de Fray Bentos está no bairro Anglo, berço do famoso frigorífico de mesmo nome e que hoje é conhecido por Museu da Revolução Industrial. A visita é obrigatória, mas o apreço pelo lugar, assumo, deve ser opcional.

O passeio pelo museu causa estranheza e desconforto. É uma mistura de sentimentos entre “Que loucura! Que lugar incrível! ” e o “Como o ser humano é capaz de tamanha atrocidade?”. Eu não sou nenhum militante vegetariano defensor dos animais, mas confesso que entender o passado desse frigorífico me reportou aos livros de história sobre os campos poloneses de Auschwitz. Sem exagero.

A estrutura do museu em si é simples, mas espaçosa e bem cuidada. O galpão principal está localizado dentro da gigantesca planta fabril, que mais parece uma vila, desativada nos anos 80. Não há muitas placas e tampouco uma recepção evidente. Era um Sábado, meio da manhã, e eu me preparava para um dia de grande movimento – e não poderia estar mais enganado. Com pouca opção, eu e Kelly optamos pela visita sem guia e percorremos todo o lugar sozinhos, sem qualquer companhia.

A fábrica foi fundada em 1865 por alemães que, graças ao invento de um cientista maluco, produziam extrato de carne para alimentar suas tropas em guerra. Em 1924 um grupo britânico assumiu a planta com o mesmo objetivo e a transformou no poderoso Frigorífico Anglo del Uruguay, cujo apogeu da produção abatia mais de 6 mil animais por dia (!!!) para produzir corned beef (carne desidratada enlatada) como alimento para os aliados da Segunda Guerra Mundial.

Trata-se de um lugar misterioso para passear, com enormes galpões, máquinas encalhadas, matadouros volumosos e refeitórios abandonados. As paredes exibem dados históricos e números assombrosos do antigo Anglo. A montagem é modesta, mas bem feita.

Embalagens da época retratam a força da produção.

Com o crescimento, a fábrica passou a preparar outros enlatados.

Os Fray Bentos Corned Beefs ganharam tanta popularidade ao redor do mundo que ainda hoje são sinônimos de qualidade. Não à toa, as atuais tortas de carne enlatadas inglesas – aquelas da latinha azul – levam o nome da vilazinha uruguaia. Duvida? Clique aqui e aqui.

Era dali também que saía os embutidos top de linha que iam à Europa. Além da primeira linha de fabricação em grande escala dos atualmente conhecidos caldos de carne.

Ufa! Na boa, achei o lugar fantástico. É muita história. Depois que vai embora você fica horas conversando sobre o passeio.

Saindo de lá, deixe a fábrica pela Rambla Panorámica com um super visual do rio Uruguay.

ONDE FICAR

Não existem muitas opções de hospedagem. E nem precisa. O Gran Hotel Fray Bentos está no coração da cidade, tem boa estrutura, staff prestativo e diárias que não passam de 45 dólares.

A gente nem rodou muito em busca de outro lugar. Paramos ali e ficamos.

Outra opção é ficar no povoado vizinho de Las Cañas – que só ouvi falar e não sei como é.

COMO IR

Fray Bentos está a 320 Km de Montevidéu. O trecho é percorrido pela Ruta 1 até o Km 128, onde há um entroncamento para a Ruta 2. Dali são mais 185 Km de ótima estrada, em pista simples mas pouquíssimo movimentada, com pedágio.

A verdade é que ir direto desde Montevidéu é bobeira. A melhor forma de colocar a cidade no seu roteiro é encarar ela como extensão a partir de Colonia del Sacramento.

De Colonia são menos de 4 horas de viagem. Prefira a Ruta 21 e faça um pit stop rápido em Carmelo. Siga mais 110 Km até a cidade de Mercedes, que é “grandinha”. Siga as placas em busca da Ruta 2, ou Argentina, e a ponte para atravessar o rio Negro – são mais 30 Km até Fray Bentos.

É confuso? Não. As rodovias uruguaias são excelentes, pouco movimentadas e muito bem sinalizadas. Leia mais AQUI.

De ônibus, a COT faz o trajeto desde a capital em duas rotas, com duração de 4 ou 5 horas (informe-se). Via Colonia, a viação Chadre realiza o percurso, mas não encontrei opção de vendas de passagem online. Procure no terminal.

A bem cuidada fronteira com a Argentina 

Em Fray Bentos há uma movimentada ponte internacional em fronteira com a Argentina. Do outro lado do rio está a cidade hermana Gualeguaychú, a 30 Km da aduana e aproximadamente 250 Km da capital Buenos Aires.